Quando o Tempo Se Prostra
- Yilan Ruh
- 30 de abr.
- 1 min de leitura

Mais um ano tomba sobre mim, sangrento,
como as folhas que tombam sob a foice.
E eu, marcada — em carne e sofrimento —
ergui-me, feito sombra, noite após noite.
Chorei em vermelho. Sorri em preto.
Costurei as perdas com fios de luto.
O que sobrou de mim? Um esqueleto
revestido de aço — imortal, absoluto.
Mas ergui o corpo — altar profano —,
dos ossos fiz colunas, do aço, cruz.
E agora, quando sangro, é soberano:
meu sangue traça mapas onde a dor reluz.
Não há deus que me salve ou destrua —
sou filha do outono: criança e senhora.
Deixei que o tempo me sorvesse em sua
taça de decadência, hora por hora.
O tempo, esse carrasco que fende sem pena,
prostrou-se, enfim, diante da minha ruína.
Fiz das feridas — coroas, da dor — a cena
de uma mulher que a própria morte declina.
Não há céu que me quebre, nem abismo
que resista à fúria que, em mim, transcendeu.
Transmutei o pranto em rito e batismo:
fiz fogueira nas cinzas da brasa que ardeu.
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