Não monogamia, geração Z, 2024 e abobrinhas escritas com enxaqueca
- Yilan Ruh
- 2 de dez. de 2024
- 3 min de leitura

Percebi que grande parte das pessoas entrou em profunda crise de identidade esse ano. Estou inclusa. Vi cada uma das minhas verdades existenciais caírem por terra até que os valores que construí para ancorarem a minha existência deixarem de fazer sentido. Privada de tudo o que construí, me vi imersa em um mar de angústia, restando apenas a incompletude de quando nos esvaziamos do mundo e a incerteza de tudo que não fosse a morte.
Chega um ponto da nossa vida que a gente tem que aprender a ser sincero conosco, porque sustentar máscaras envolve um grande dispêndio de energia, insustentável a longo prazo sem graves prejuízos ao organismo. Meus amigos brincam que eu não sirvo para ser piranha. E não sirvo mesmo. Acho sexo casual uma grande merda, completamente desprovida de qualquer sentido além de um prazer momentâneo que pode ser alcançado com um vibrador e um filme pornô e que depois vai te deixar com aquela sensação de vazio que só vem do desejo que foi saciado, já que o desejo exige autodestruição. Fico entediada com qualquer pessoa que não consiga desenvolver um único elogio que não tenha relação com a minha aparência. E duas vezes mais entediada com o esforço de ancorar relações pautadas em autofelação, onde todo mundo tem uma vida de contos de fadas e você tem que fingir que tem também. Talvez por isso eu tenha me percebido cada vez mais só. E a sensação de liberdade que vem de estar em acordo com o que faz sentido pra si é uma delícia!
Minha geração é péssima. Não que as outras sejam muito melhores. Mas me parece que metade de nós entrou em uma busca constante por validação que passa por colecionar afetos e utilizá-los como se fossem sapatos e a outra metade está tão traumatizada que é incapaz de se permitir um encontro sem estar usando uma armadura da cabeça aos pés. Temos medo do apego e temos medo que o outro se apegue. Consumimos conteúdo repleto de superficialidade, universal, criado para gerar o máximo de identificação e engajamento e nos frustramos pela falta de autenticidade. Aceleramos todos os processos ao máximo e reclamamos da fragilidade sobre a qual as coisas foram construídas. Desistimos de tudo muito fácil, porque tudo está muito disponível para nós e novas possibilidades estão sempre à vista. Estamos todos doidos e eu tenho certeza que isso é reflexo do contato precoce com o mundo digital e dessa facilidade de se conectar e desconectar de pessoas.
Diante disso, precisei me perguntar: eu sou realmente não monogâmica ou eu só não quero me comprometer verdadeiramente com alguém porque eu acredito que a única coisa pela qual vale a pena morrer é o amor (e eu tenho isso tatuado)? Eu sou realmente não monogâmica ou todas as vezes em que me vi amando uma segunda pessoa foi porque estava deixando de amar a primeira, meu instinto de autopreservação tentando proteger o meu organismo, direcionando meu afeto para algo que não estivesse me destruindo? Eu sou realmente não monogâmica ou eu só rejeito a solidez de um relacionamento romântico porque estive em relações onde eu me comprometia demais enquanto o outro se comprometia de menos? Eu sou realmente não monogâmica ou eu me tornei tão insegura que prefiro saber que quem está comigo tem outras pessoas que confiar em alguém de novo e desenvolver um novo bloqueio emocional?
Dia desses adiei um reencontro. Ele com medo de dormir junto porque "se apega" e eu com medo de convidá-lo à minha casa porque é impossível não desvendar cada traço meu sem conhecer o meu cantinho. Saímos uma única vez e as armaduras caíram sem querer. Foi constrangedor perceber quanta fragilidade tínhamos embaixo de corpos tão fortes. Pouco tempo de vida para tantas experiências, que exigiram mais maturidade do que tínhamos quando fomos obrigados a dar conta delas. Não consigo usar armadura em casa. E sei que quando eu tiro a minha, o outro sempre tira também. Nem eu sei se evitei por medo de me machucar ou de machucá-lo. Mas que tristeza eu sinto quando percebo que, tanto ele quanto eu, poderia (facilmente) colocar um outro "alguém" no lugar.
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