Enquanto eu jantava sozinha

Hoje fiquei só. A princípio, senti-me solitária. Aquele som terrível se fez uivar novamente em meu peito, nas aberturas, naqueles espaços vazios que insisto em lutar para que nunca sejam preenchidos. Naqueles espaços vazios onde um dia habitaram afetos doces, sonhos fugazes, efêmeros, primaveris. Naqueles espaços vazios onde germinou a alegria antes que o inverno de minha alma chegasse e arrebatasse tudo.

Há bons anos que prefiro fazer tudo sozinha. Detesto aglomerações e me entedio facilmente. Além disto, sinto que estou sempre cimentando muralhas cada vez mais altas entre mim e o Outro. Mas, de algum modo, as noites de sexta-feira me afetam de um modo diferente. E algumas vezes eu sinto falta de algo, falta de alguém que preencha meu vazio. Serão as repercussões das inúmeras fotos, de pessoas que na maioria das vezes sequer conheço realmente (amizades líquidas?) incidindo sobre mim? Talvez.

Decidi tomar um banho frio. Sempre que me sinto arrebatada pela angústia, o frio me devolve uma certa ilusão de solidez. Demorei-me, sentindo o toque da água gelada e o aroma do meu sabonete predileto me invadirem. Saí, e ainda de toalha, decidi preparar algo. Se estava só, para que toalha? Para que vestimentas, para que véus, para que cortinas? Dane-se a toalha! Enquanto preparava o jantar, decidi tomar uma taça de vinho. Não pude deixar de pensar em que ato de insanidade me levou a cozinhar, nua e molhada, enquanto tomava vinho português. Dane-se também! Tudo bem ser louca às vezes. Estou farta de ser sempre a voz da racionalidade, a personificação dos "pés-no-chão".

Enquanto eu jantava sozinha, descobri novas facetas de mim. Mulheres que gostam de cozinhar nuas enquanto bebem vinho, garotas que gostam do aroma de seus cosméticos prediletos emanando de suas peles, meninas que gostam de escrever em blogs enquanto espantam seus queridos gatos, que estão ávidos por abocanhar suas ceias nem tão solitárias.

Enquanto eu jantava sozinha percebi que estou aprendendo a gostar de mim. E se busco me preencher de mim mesma, já não janto assim tão só.